O brasileiro ainda sonha em se aposentar cedo – na média, aos 56 anos. Mas apenas uma minoria age para realizar esse sonho, informa uma pesquisa recente
Manter o padrão de vida de classe média depois da aposentadoria tornou-se um desafio na maioria dos países, mesmo nos mais ricos. Os governos já não dão conta de sustentar milhões de pessoas que passaram do auge da vida produtiva mas que ainda vão viver por décadas. No Brasil, o problema preocupa ainda mais — por causa do benefício pago pelo governo federal, pequeno para os padrões das classes A e B (hoje, o valor mais alto pago pelo INSS é R$ 2.400), e, principalmente, porque o brasileiro poupa menos do que precisa. A noção da seriedade do problema é bem difundida, mas a maioria das pessoas não reage diante da situação, mostra uma pesquisa feita pela seguradora americana MetLife com 2.930 assalariados empregados em cinco países. O estudo, feito anualmente, incluiu em sua edição 2011 Brasil (pela primeira vez), Austrália, Índia, México e Reino Unido.
A pesquisa perguntou com qual idade assalariados gostariam de se aposentar. Os brasileiros foram os mais apressados: querem parar, na média, aos 56 anos, o que poderia ser considerado prematuro. Na Austrália e no México, a expectativa média fica perto dos 60 anos e no Reino Unido, dos 63 (na Índia, a conta nem foi feita, já que metade dos participantes acha que nunca poderá parar de trabalhar). O desejo dos brasileiros se torna especialmente difícil de alcançar por causa da inação. Apenas 30% dos entrevistados deram os primeiros passos no planejamento financeiro na aposentadoria, contra 39% dos australianos e 66% dos britânicos (mexicanos e indianos planejam ainda menos que nós: apenas 24% e 15%, respectivamente, começaram a elaborar uma estratégia de poupança). “Essa falta de ação ocorre apesar de os brasileiros, assim como os mexicanos e indianos, terem sérias preocupações financeiras quanto ao futuro”, diz Shankar Chaudhuri, diretor de Inteligência de Mercado Global da MetLife.
Com a economia em crescimento, o cenário não deveria ser outro? Infelizmente, a mudança de hábitos não acompanha a velocidade da economia. “Racionalmente, faz sentido poupar quando a economia vai bem, mas é justamente nesse momento que as pessoas têm emprego e crédito. Elas querem é consumir agora e não guardar para o futuro”, afirma Ricardo Rocha, professor da Fundação Vanzolini.
Deixar de investir hoje pode ter no futuro efeitos ruins não apenas para o indivíduo, mas também para seus filhos. A falta de poupança perpetua o ciclo dos idosos que passam a depender dos filhos. De acordo com um levantamento do IBGE, só 1% dos aposentados tem certa independência financeira. Na pesquisa da MetLife, 63% das pessoas responderam que estão preocupadas se vão ter dinheiro para sustentar os parentes mais velhos. Da mesma forma, mais da metade se preocupa em se tornar “um peso” para os filhos na velhice. Entre aqueles que já cuidam dos pais idosos, 70% vive só com o salário (não tem outras economias com as quais contar). A maioria dos trabalhadores (70%) disse estar extremamente preocupada com o custo do plano de saúde na aposentadoria. Entre os que já poupam, 69% estão apreensivos com a chance de viver mais do que sua poupança será capaz de sustentá-los.
Embora o nível de poupança interna no Brasil seja baixo e o país não tenha a cultura de investimento pessoal, há alguns discretos sinais de mudança. Nos últimos cinco anos, cresceu bastante o número de brasileiros que investe em ações (de 220 mil para 610 mil) e que têm caderneta de poupança (de 77 milhões para 97 milhões). O número de planos de previdência privada sendo alimentados com depósitos mensais passou de 8,3 milhões para 10,7 milhões. Um deles é o da designer Elaine Sakai. Embora tenha apenas 24 anos, ela concluiu que já vale a pena pensar na aposentadoria. “Eu me preocupo com o futuro. Não quero ter de trabalhar tanto quanto hoje quando estiver mais velha.” Elaine conta que, no começo, era doloroso fazer os depósitos mensais. Depois, acostumou-se. Os amigos não compartilham a preocupação. “Acho que conheço só uma pessoa com idade próxima da minha que tem previdência. Quando você é novo, não pensa no que vai acontecer depois”, diz. Ela pensa. Tomara que mais gente siga o exemplo.
(Época)