Brasileiro vive cada vez mais e desafia a Previdência

fev 18, 2015 | Notícias

A expectativa de vida da população brasileira cresce a cada ano. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), quem nascer em 2020 viverá, em média, 76,7 anos, aumento de dois anos e oito meses em relação a 2010. Nas projeções por Estado, o paulista nascido em 2030 pode chegar até os 80 anos.

O fato de as pessoas estarem vivendo mais é uma ótima notícia para a sociedade brasileira, mas requer maior planejamento da população quanto aos seus gastos e receitas no futuro. Assim como o poder público, que terá papel fundamental quanto à sustentação da aposentadoria do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) devido ao crescimento da população de terceira idade.

De acordo com estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a população brasileira terá cada vez menos jovens e mais idosos. A proporção dos ‘superidosos’, aqueles com 80 anos ou mais, estará entre a mais numerosa. Em 2060, esse grupo etário representará 10,5% do total de mulheres e 8,76% do total de habitantes no País.

Do ponto de vista previdenciário, a população com 60 anos ou mais é especialmente relevante. Isso porque, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2012, oito em cada dez beneficiários da Previdência Social são representados por essa faixa etária.

AUMENTO X DESPESAS – Estatísticas do Ipea mostram que, entre 2011 e 2012, houve relativa estabilidade na necessidade de financiamento do pagamento dos benefícios do INSS, assim como o crescimento considerável das despesas com os respectivos benefícios. O gasto mensal do RGPS (Regime Geral de Previdência Social) engloba aproximadamente 26 milhões de benefícios, dos quais 25 milhões são estritamente previdenciários. No âmbito do RPPS (Regime Próprio de Previdência Social), que compreende os servidores públicos, a União paga, mensalmente, cerca de 1 milhão de benefícios.

Segundo Marcelo Caetano, especialista em previdência e pesquisador do Ipea, os brasileiros estão se aposentando muito cedo e, com a esperança de vida crescendo cada vez mais, os gastos do INSS tendem a ser ainda maiores. “É necessário adotar conjunto de ajustes, como o governo federal tem feito agora com a pensão por morte e outros benefícios, para que não haja um desarranjo no sistema previdenciário público no futuro.”

A advogada e vice-presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), Adriane Bramante, não considera que esses gastos tenham sido ruins, muito pelo contrário. “Temos hoje população maior e mais protegida. Antes, essas pessoas encontravam-se abaixo da linha da pobreza e, atualmente, podem contar com o benefício previdenciário. É um avanço”, acredita. Para ela, é preciso olhar além do aspecto econômico. “É imprescindível analisar a situação sob o viés social, cujo objetivo é oferecer cobertura previdenciária, principal foco da Seguridade Social.”

O advogado Thiago Luchin, especialista em Direto Previdenciário e sócio do Aith, Badari e Luchin Sociedade de Advogados, analisa que os números indicam que os brasileiros vão receber benefícios por períodos mais longos de tempo, enquanto aqueles que contribuem com o sistema vão diminuir. “Acredito que, infelizmente, será necessário aumentar o período de contribuição para aposentadoria, contudo, também é necessário criar incentivos aos trabalhadores que vão se aposentar, com correções justas e salários dignos, fazendo com que a população recupere o interesse em ter um benefício um dia, ou seja, demonstrar a importância de pagar a previdência”, diz.

O professor e autor de obras de Direito Previdenciário Marco Aurélio Serau Jr. analisa que a preocupação maior é no sentido de que a gestão das contas públicas não anule a ideia de que o Estado deve proporcionar ao cidadão a cobertura previdenciária. “É certo que alguns ajustes são necessários, mas não se deve deixar predominar o argumento de insuficiência financeira. Até porque há enormes gargalos na gestão previdenciária, como a concessão de isenções tributárias, a evasão e sonegação fiscais, falhas estruturais na arrecadação em virtude da informalidade no mercado de trabalho, concessão de parcelamentos que ensejam arrecadação tributária irrisória, mesmo para grandes devedores. Deve haver um equilíbrio na redução da cobertura previdenciária, devido a essa alteração social importante, mas também aprimoramento das bases de financiamento da Seguridade Social, senão apenas a população é quem perde com isso.”

Fator deverá ampliar redução dos benefícios

O aumento da esperança de vida também afeta o bolso dos brasileiros. Quando as pessoas vivem mais, o desconto do fator previdenciário nas aposentadorias é maior, ou seja, menor é a quantia paga por benefício. O fator é utilizado no cálculo do valor das aposentadorias por tempo de contribuição. Na aposentadoria por invalidez não há utilização do cálculo e, na aposentadoria por idade, a fórmula é utilizada opcionalmente, apenas quando aumentar o montante do benefício.

Pelas regras da aposentadoria por tempo de contribuição, se o fator for menor do que 1, haverá redução do valor do benefício. Se for maior que 1, terá acréscimo e, se for igual a 1, não haverá alteração.

Marcelo Caetano, pesquisador do Ipea, explica que ao considerar as idades médias que as pessoas estão se aposentando hoje no Brasil, o fator previdenciário está repondo por volta de 70% dessa média. “Se não existisse o fator, essa reposição seria integral, o que é insustentável do ponto de vista técnico. O rombo na Previdência iria aumentar ainda mais”, alerta.

Quando o fator foi criado, em 1999, o segurado que chegasse aos 60 anos de idade e 38 de contribuição ao INSS conseguiria atingir o fator 1. Atualmente, com o aumento da longevidade, para obter fator 1, o contribuinte precisa ter 62 anos de idade e cerca de 40 de contribuição.

De acordo com a vice-presidente do IBDP, Adriane Bramante, apesar de diminuir o valor da renda mensal da aposentadoria, o fator não foi suficiente para convencer os trabalhadores a adiarem o pedido. “Há enorme insegurança jurídica em relação às iminentes reformas, e o segurado tem grande receio de ficar sem a aposentadoria e trabalho”, afirma.

Na visão de Noa Piatã Bassfeld Gnata, advogado, professor de Direito Previdenciário e mestre e pesquisador em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela USP (Universidade de São Paulo), o fator previdenciário foi pensado para inibir a concessão de benefícios previdenciários, tendo em vista o impacto substancial nos seus valores. “A intenção, em 1999, era iniciar o esvaziamento das aposentadorias por tempo de contribuição, a qual, até hoje, têm direito mesmo pessoas com 44 ou 49 anos de idade, em proveito das aposentadorias por idade, que não têm essa redução. Ele não se prestou aos seus fins, pois a estatística oficial mostrou linearidade na quantidade de novos benefícios por tempo de contribuição no início da década de 2000, mesmo com seus efeitos nefastos”, observa.

Segundo o especialista, isso aconteceu porque as pessoas entre 50 e 60 anos, geralmente, dispõem tanto de força de trabalho quanto da vontade de ter renda extra (a aposentadoria) para poder fazer mais coisas e ter mais qualidade de vida nesse período.

Piatã estima que o impacto do fator previdenciário no valor dos benefícios pode chegar a 50%, para pessoas mais jovens. Ele exemplifica: um homem que obtenha média de contribuições históricas de R$ 3.000: se tiver 50 anos de idade e 35 de contribuição, o fator reduz em 40% o benefício, com renda inicial de cerca de R$ 1.800. Em menos de dez anos, se continuar a política pública de valorização do salário mínimo, que cresce acima da inflação (os benefícios da Previdência apenas a repõem), estará recebendo um salário mínimo.

fonte: www.dgabc.com.br

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